Ziraldo mudou campanhas de prevenção da saúde, dizem especialistas

O Instituto Nacional do Câncer (Inca) inicia esta semana o curso EAD do Programa Saber Saúde. Como sempre, as ilustrações feitas por Ziraldo na década de 1990 estarão nas aulas, mas desta vez recebem atenção especial e muita nostalgia. “Ele contribuiu muito, tanto para o controle do câncer quanto para o controle do tabagismo. Recebemos a notícia do seu falecimento com muita tristeza, pois todos temos muito carinho por ele, pelo trabalho que sempre fez e por essa importante parceria com o Inca. Seu legado certamente ficará eternizado”, afirma a chefe da Divisão de Controle do Tabagismo e Outros Fatores de Risco (Conprev) do Inca, Maria José Domingues da Silva Giongo.

A parceria de Ziraldo com o Inca começou antes do Saber Saúde, em 1987, em uma campanha contra o cigarro, que resultaria em cinco cartazes com caricaturas com os dizeres: “fumar é cafona”, “fumar é cara séria”, “fumar é mau gosto”. “fumar é patético” e “fumar é cafona”. Esses cartazes foram amplamente divulgados no último fim de semana nas redes sociais.

A secretária-executiva da Comissão Nacional para Implementação da Convenção-Quadro para o Controle do Tabaco (Conicq), Vera Luiza da Costa e Silva, foi uma das pessoas que trabalharam com Ziraldo naquele momento, quando as propagandas de cigarros ocupavam a televisão e outros meios de comunicação e sobre 35% da população eram fumantesde acordo com o Inca.

“Naquela época, as campanhas [antitabagistas] estavam com caveiras, com revólveres, com algo sempre associado à morte, à doença, ao infortúnio. E aí ele falou: ‘Olha, está tudo errado. O que mudará a forma como as pessoas veem o tabagismo é o lado comportamental. É preciso afirmar que fumar é cafona, que é rude, que é cafona, que é de mau gosto. E aí ele falou: vou fazer essa campanha”, conta Vera.

A Inca procurou Ziraldo justamente porque queria uma abordagem inovadora para uma campanha antitabagismo. E foi isso que Ziraldo entregou. O trabalho logo foi reconhecido. Ainda em 1987, o cartunista foi premiado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) pela sua contribuição à campanha Tabaco ou Saúde.

A campanha funcionou até com o próprio Ziraldo. “E ele fumava na época. Então, ele fez a campanha e foi tão impulsionado por ela que parou de fumar, entendeu?”, diz o secretário.

O Brasil também mudou com o tempo. Anúncios de cigarros foram proibidos na mídia. Em 2019, o percentual de fumantes caiu para 12,6%, segundo a Pesquisa Nacional de Saúde (PNS).

A campanha mostrou o poder das imagens. “O poder da ilustração e do conceito, certo? Mudou todo o universo da época”, afirma o secretário. “Devemos muito a ele na área de saúde pública, acho que ele introduziu um conceito que realmente mudou até a nossa visão. Mudou por causa do Ziraldo”, acrescenta. Segundo ela, a escritora contribuiu para definir o tom das campanhas de prevenção num momento em que o país ganhou uma nova Constituição, em 1988, e posteriormente definiu o Sistema Único de Saúde (SUS).

Conheça Saúde

O sucesso foi tanto que a parceria de Ziraldo com o Inca continuou e, em 1998, ele também faria ilustrações para o Programa Saber Saúde, de prevenção ao tabagismo e outros fatores de doenças crônicas. As ilustrações foram todas fornecidas ao Inca e continuam sendo utilizadas. O programa é direcionado às escolas, oferecendo capacitação a professores e profissionais de saúde, para que possam levar informações a crianças e jovens. Além do tabagismo, o programa alerta sobre os riscos de hábitos como consumo de álcool, exposição excessiva ao sol sem proteção, alimentação pouco saudável, entre outros.

“As imagens falam por si, falam às crianças e aos jovens. Você olha uma folha, uma planta tossindo, expelindo fumaça, a criança olha e vê os danos que isso causa à saúde, o quanto isso faz mal. E o mais legal é que a partir disso reforçamos os fatores de proteção, os comportamentos que eles precisam ter, para que no futuro não tenham doenças crônicas”, afirma Maria José Giongo, responsável pelo programa.

Ela diz que o programa é um sucesso e que muito disso se deve ao Ziraldo: “Tem uma recepção muito boa, eles gostam muito, porque o Ziraldo é conhecido a nível brasileiro, a nível nacional, tanto pela educação e profissionais de saúde e por crianças. . Então, a receptividade dos materiais, eles pedem, querem, gostam. Oferecemos turmas para o curso e mais profissionais se inscrevem do que a quantidade de vagas que podemos oferecer”.

Tanto Vera, que morava com o escritor, quanto Maria José têm muito carinho por Ziraldo. “Ele contribuiu muito para esse trabalho de promoção e prevenção da saúde aqui no Inca e deixou um legado que certamente ficará eternizado, continuará a deixar as pessoas mais felizes e, sem dúvida, a mostrar às crianças a importância de fazer opções mais saudáveis”, lembra Maria José .

Para Vera, “a genialidade, o comprometimento, a leveza de Ziraldo permanecerão em seu trabalho. Mas perdemos a pessoa, certo?

2024-04-09 15:18:00